“Em carta da prisão, Roberto Jefferson critica postura de Joaquim Barbosa
‘Cadeia, 19/05/14’. É assim que Roberto Jefferson começa uma carta à Folha, escrita à mão, do Instituto Penal Coronel PM Francisco Spargoli Rocha, em Niterói (RJ) (…)
Ao citar o desafeto José Dirceu, uma surpresa: ‘Sobre o Dirceu, penso que o JB está exagerando e vitimizando a turma do PT’ (…)
‘Ele [Barbosa] monocraticamente revogou uma jurisprudência consagrada em todas as comarcas e tribunais do Brasil. Até no STJ [Superior Tribunal de Justiça] os condenados no semiaberto trabalham desde o primeiro dia da execução da sentença. Nitidamente o JB tem diferenças pessoais com a Turma do PT’”
Todo condenado tem direito (mas não a obrigação) de trabalhar. O que é diferente dependendo do regime em que a pena está sendo cumprida é onde ele pode trabalhar, ou seja, se dentro ou fora da prisão.
Se lermos a lei, é o preso em regime aberto que cumpre a pena em casa de albergado, ou seja, aquele em que ele só volta para dormir e nos fins de semana. O preso em regime semiaberto deve cumprir pena em colônias agrícolas e industriais, ou seja, trabalham dentro da colônia, e não fora.
O problema começa com o fato de que no país não há colônia para todos os presos em regime semiaberto. E como o condenado tem direito e o Estado não possibilita a ele trabalhar em colônias, os magistrados se viram obrigados a fornecerem a alternativa mais natural: possibilitar que o criminoso trabalhe fora, como se estivesse em regime aberto.
É como um ‘upgrade’ da classe executiva para a primeira classe. Não é porque o preso em regime semiaberto tenha tal direito, mas porque não tem lugar para ele na sua própria classe e não seria justo mandá-lo para a classe econômica (penitenciária).
Mas o que realmente é interessante na carta acima é o “revogou uma jurisprudência consagrada em todas as comarcas e tribunais do Brasil”.
A revolta na carta do condenado é porque um magistrado (o presidente do STF) foi contra um entendimento que outros magistrados tendem a seguir.
Há dois pontos importantes aqui:
Primeiro, apenas o STF pode impor súmulas vinculantes, ou seja, formas de interpretação a serem seguidas por todos os magistrados do país.
Jurisprudências de outros órgãos do Judiciário – e mesmo do STF que não sejam súmula vinculante – não são fontes de direito, ou seja, os demais magistrados – mesmos aqueles de primeira instância das Justiças estaduais – não têm obrigação de seguir decisão de outras cortes.
Logo, o presidente do STF, assim como o juiz de primeira instância em uma pequena comarca, tem o direito e a obrigação de decidir conforme sua convicção e melhor interpretação da lei.
O que todo magistrado tem sempre a obrigação de fazer é obedecer a lei.
E isso nos leva ao segundo ponto fundamental: não cabe ao Judiciário fazer leis. Quem as faz é o Legislativo. Os membros do Judiciário não são eleitos. Não representam a vontade dos eleitores. Não respondem aos eleitores nas urnas a cada 4 ou 8 anos. São os parlamentares que fazem leis, que representam (ou deveriam representar) a vontade dos eleitores.
Logo, não cabe ao Judiciário estabelecer leis. Cabe ao ele apenas interpretá-las. Se a lei diz que o regime semiaberto é cumprido em colônias, não é o Judiciário que pode ou deve mudar tal regra. É o Legislativo. O mesmo Legislativo do qual ambos os condenados aos quais a matéria acima se refere fizeram parte.
Ao Judiciário cabe interpretar tais leis. E interpretação de leis vai da consciência de cada magistrado. Se o legislador não quer deixar espaço para interpretação, precisa aprovar leis claras e abrangentes.
No caso acima, bastaria que a lei dissesse algo do gênero ‘na falta de vagas em colônias, o condenado em regime semiaberto terá direito à progressão automática ao regime aberto, independente da quantidade de pena cumprida ou a cumprir’. Como ela não diz, fica a critério do magistrado decidir segundo sua consciência e inteligência.